Número de unidades contratadas com recursos da caderneta caiu de 72,57 mil para 28,17 mil
Tatiana Lagôa, Diário do Comércio
A queda nos depósitos da poupança neste ano tem afetado a construção civil no País. Isso ocorre porque uma parcela considerável dos imóveis vendidos é financiada com esses recursos. Apenas no acumulado dos dois primeiros meses, o número de unidades contratadas com recursos da caderneta no Brasil caiu mais da metade frente ao mesmo período de 2015, ao passar de 72,57 mil para apenas 28,17 mil, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip).
Em se tratando de recursos envolvidos no financiamento de imóveis com recursos da poupança nos dois primeiros meses frente ao exercício anterior, a queda também foi grande. Se em janeiro e fevereiro de 2015, foram financiados um montante de R$ 15,58 bilhões no País, em 2016, foram apenas R$ 6,50 bilhões. Ou seja, também caiu mais da metade.
Uma das causas para a menor aquisição dos imóveis é a redução da disponibilidade do recurso para arcar com os financiamentos. Segundo dados do Banco Central (BC), houve uma retirada de R$ 24,05 bilhões da caderneta nos três primeiros meses deste ano, o maior volume desde o lançamento do Plano Real, quando começou a série histórica em 1995. Somente em março, as retiradas superaram os depósitos em R$ 5,379 bilhões.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Mutuários da Habitação (ABMH), Lúcio Delfino, essa situação limita a aquisição da casa própria porque grande parte dos imóveis é adquirida por meio de financiamentos. Existem dois tipos principais, um fomentado pelos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e outro pela poupança.
Os recursos do FGTS arcam com os financiamentos de imóveis pelo programa Minha casa, minha vida (MCMV) e outros que se enquadrem em alguns critérios. A primeira exigência é que seja o primeiro imóvel e que a unidade custe até R$ 750 mil em Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal ou R$ 650 mil nos demais estados. Além disso, é preciso que o mutuário colabore por, pelo menos, três anos com o FGTS, o que já exclui servidores públicos e microempreendedores.
O restante dos compradores, desde que o imóvel custe até R$ 750 mil, depende da poupança. “A falta de recursos na poupança afeta principalmente a classe média que pretende comprar um imóvel um pouco mais caro, acima de R$ 200 mil, ou quer trocar de apartamento”, afirma Delfino.
Por causa dessa baixa no recurso disponível, o governo e os bancos têm tomado uma série de medidas visando reduzir a tomada do crédito. Uma das medidas é a redução do limite financiável, que já foi de 80% e agora está em 70%. Além disso, as taxas de juros foram aumentadas em março. A taxa balcão passou de 9,9% ao ano para 11,22% ao ano o que deve levar a um impacto global no preço de imóvel de aproximadamente 7%.
Segundo o presidente da Câmara da Indústria da Construção Civil da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Teodomiro Diniz Camargos, uma maior dificuldade para financiar imóveis impacta diretamente nas vendas. “É um aumento das barreiras. E isso ainda ocorre em uma fase em que o mercado está ruim e com perspectivas de pioras”, afirma.
Além da redução na demanda, a situação tem levado a uma mudança no perfil dos imóveis em Minas Gerais. “Há uma tentativa por parte dos construtores de reduzir os preços dos imóveis. E a forma encontrada para isso tem sido construir unidades menores”, afirma.
Retração – A má notícia é que as quedas na poupança deverão ser mantidas ao longo do ano. Segundo o diretor executivo de Estudos e Pesquisas Econômicas da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel José Ribeiro de Oliveira, são várias as explicações para as retrações na caderneta. A primeira delas é a baixa rentabilidade da poupança que torna maior a rentabilidade de aplicações financeiras em fundos de renda fixa, levando a uma migração dos investimentos.
A segunda justificativa é a baixa atividade econômica com queda na renda das famílias e aumento do desemprego. “Nesse caso, acontecem duas coisas. Uma é que não sobra dinheiro para aplicar na poupança. E outra que as pessoas necessitam resgatar os recursos empregados na poupança para pagar dívidas”, afirma. Como tudo indica que o quadro econômico do país não deva ser alterado a curto prazo, Oliveira acredita que a poupança deverá seguir com resultados negativos.