Fonte: Comunique-se

Os detratores de Paulo Nogueira o chamaram de “petista” até sua morte na noite do dia 29 de junho de 2017, aos 61 anos. Duro nos posicionamentos editoriais e políticos, é dele a criação do Diário do Centro do Mundo (DCM) em 2009 – primeiro como uma coluna de correspondente em Londres na revista Época (daí vem o nome “centro do mundo”) e depois como um site hardnews de posicionamento claro de esquerda. Não o perdoaram. Por analogias críticas mordazes, Paulo foi acusado de ser o “Reinaldo Azevedo esquerdista”, de fazer “jornalismo marrom” e de ter um “blog sujo”.

O fato é que o DCM defendeu claramente os governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff por programas sociais como Bolsa Família, ProUni e outros, que tiraram mais de 30 milhões de pessoas da linha da miséria no Brasil. Nas eleições de 2014, o DCM apoiou e elegeu Luciana Genro, do PSOL, personalidade do ano do site. Hoje a página critica ela. O posicionamento do Diário foi contra os grandes grupos de comunicação brasileiros, notadamente Abril, Globo, Folha e Estado, que ganharam vigorosos financiamentos na era Fernando Henrique Cardoso. O DCM também fez eco com a mídia próxima das esquerdas no geral, incluindo Carta Capital, Caros Amigos, Conversa Afiada, Brasil 247, Portal Vermelho, Revista Fórum, GGN (Luis Nassif), Opera Mundi, Outras Palavras, Ponte Jornalismo, Jornalistas Livres e Mídia Ninja.

O posicionamento de Paulo Nogueira contrastou porque ele trabalhou por 10 anos na revista Veja, a maior publicação liberal e de direita no Brasil. Não bastasse isso, dirigiu Exame nos anos 90, elevando o padrão da revista que passou a apoiar abertamente políticas neoliberais, e, como diretor superintendente, reformulou as revistas Superinteressante, Placar, Quatro Rodas e Playboy. VIP foi sua criação nesta época. Entre 1997 e 1998, Paulo defendeu a candidatura de FHC à reeleição. Hoje, o seu DCM faz reportagens apurando a corrupção de Fernando Henrique naquele tempo.

Depois, sem chegar à direção da revista Veja ou até posições superiores dentro da Editora Abril, Paulo foi até a Editora Globo e se tornou seu diretor. Reformulou a revista Época e lançou mais duas: Época São Paulo (hoje fechada) e Época Negócios (concorrente da Exame).

Não há contradições na mudança ideológica de Paulo Nogueira. Há uma visão de mundo específica e um instinto para captar necessidades de mercado.

Paulo tornou-se correspondente em Londres na mais severa crise econômica global, a de 2008, que afetou os Estados Unidos e a Europa. A crise permanece e quebrou a hegemonia do pensamento neoliberal de Estado mínimo. O FMI hoje em dia já cogita ajuda estatal para salvar nações falidas graças a uma epidemia causada pela quebra do mercado imobiliário norte-americano e a quebra do banco Lehmann Brothers, hoje resgatado após a presidência Barack Obama. Paulo Nogueira estava atento a estes movimentos, cobriu os protestos de rua e trouxe sua experiência ao Brasil.

Ele detectou que faltava um veículo de esquerda 100% digital e dedicado a grandes reportagens. O DCM nasceu desta ideia, guiado por princípios ideológicos de países como Finlândia, Suécia, Noruega e outras nações escandinavas que vivem uma mistura de capitalismo e poder público/estatal fortalecido. Algo que foi tentado, parcialmente, por governos petistas no Brasil.

O DCM é um produto coerente em sua proposta e, de acordo com o irmão Kiko Nogueira, o novo diretor do site, foi o período que Paulo mais gostou de trabalhar. 

Livre das grandes empresas, criticou patrões e métodos arcaicos de jornalismo, sobretudo da televisão aberta sob a Globo e da mídia de papel.

Em diferentes textos e entrevistas, Paulo Nogueira se dizia admirador de Arianna Huffingon, a criadora do Huffington Post (hoje HuffPost). De origem grega, ela foi conservadora nos anos 90 e casada com o político republicano Michael Huffington. Hoje, Arianna se converteu aos ideais das lutas de minorias LGBT nos Estados Unidos, a uma nova esquerda ativista e aos ideais do Partido Democrata, que são os mais progressistas dentro do grande jogo político norte-americano.

Paulo seguiu o mesmo caminho. Não teve medo de mudar de ideia e consolidar a real mídia democrática, de oposição ao discurso mainstream. E fez isso com as ferramentas que aprendeu na grande mídia.

Fará falta. Já faz, mas vive nos inúmeros jornalistas que formou.