O Globo, Rennan Setti, 10/out
Por meio do home equity, o cliente pode tomar emprestado junto ao banco até 60% do valor do seu imóvel, que deve estar quitado – em alguns bancos, como Santander e Máxima, o limite é menor: 50%. Por ser garantida, a transação oferece pouco risco à instituição financeira, daí as taxas cobradas serem mais baixas. Há bancos que cobram 1,45% mais inflação ao mês, por exemplo. O prazo para pagar chega a 15 anos. O pagamento costuma ser feito em parcelas mensais, mas algumas instituições permitem negociar amortizações trimestrais ou semestrais. Outras ainda dão carência de alguns meses para o início dos pagamentos. Em geral, os bancos exigem que as parcelas comprometam, no máximo, 30% da renda do tomador.
Embora exista há anos no mercado brasileiro, o home equity é pouco conhecido. O Banco Central (BC) e a maioria dos bancos não divulgam dados específicos sobre essa linha, mas sua carteira total está entre R$ 12 bilhões e R$ 15 bilhões, estima Luiz Pedro Albornoz, presidente da Novi Soluções Financeiras, que promove a contratação desse crédito. Assim, representaria menos de 3% do saldo de R$ 525 bilhões do financiamento imobiliário no país. No Bradesco, a carteira de home equity supera R$ 2 bilhões, segundo o diretor da área de Empréstimo, João Carlos Gomes da Silva. No Banco do Brasil, a linha existe há apenas dois anos.
– Acho que os bancos não têm muito interesse em divulgar essa linha, porque ela tem uma margem menor e custo maior, já que exige mais burocracia. A papelada é processada rapidamente, mas reuni-la e processá-la é trabalhoso – diz Albornoz.
Mas, embora a publicidade não seja o forte do home equity, o fato é que todos os grandes bancos o oferecem. No Santander, a procura tem vindo de clientes endividados e de pequenos empreendedores atrás de capital de giro, gente de classe média com imóvel avaliado entre R$ 500 mil e R$ 600 mil em grandes metrópoles, explica Gilberto Abreu, diretor-executivo de Negócios Imobiliários. O Banco do Brasil tem focado, por enquanto, no público de alta renda, salientando que o home equity pode ser uma ferramenta de educação financeira, explicou Hamilton Rodrigues da Silva, diretor de crédito imobiliário. No Bradesco, o foco é exclusivamente o empreendedorismo.
– Não usamos essa carteira para renegociação de dívida – ressalta Gomes da Silva.
REORGANIZAÇÃO FINANCEIRA PARA NÃO PERDER CASA
O risco de tomar esse empréstimo é, obviamente, a perda do imóvel. Isso porque o cliente faz uma alienação fiduciária do bem, permitindo a execução do patrimônio em caso de inadimplência. Segundo os executivos dos bancos, atrasos de mais de 90 dias geram um processo de notificação extrajudicial. Com 120 dias, a cobrança já vira judicial, e, se não for bem-sucedida, o banco tem direito a reincorporar o bem para leiloá-lo. Primeiro, tenta-se conseguir o valor de mercado do imóvel no leilão. O recurso levantado é usado para pagar a dívida, e o restante é devolvido ao correntista. Caso isso não dê certo, o banco pode tentar leiloá-lo ao valor da dívida – nesse caso, o cliente não recebe nada no fim.
– É muito raro chegar a essa etapa de execução. Caso o cliente não esteja conseguindo honrar as parcelas, é muito mais racional que ele venda o próprio imóvel para pagar a dívida, do que deixar o banco vender nas condições dele – afirma Abreu, do Santander.
Segundo os executivos, a inadimplência dessa linha de crédito é baixa, semelhante à do crédito imobiliário.
Virgínia Prestes, mestre em Finanças e professora do MBA da Faap, ressalta que esse empréstimo não pode ser usado, em qualquer hipótese, para consumo. Ele só é interessante, explica, quando o objetivo é investir em capital produtivo ou quitar dívidas mais caras. Mesmo nessas situações, o tomador deve fazer contas e mudar seus hábitos:
– Se ele estiver com dívidas, deve pegar o empréstimo, mas se organizar. Afinal, é seu imóvel que está em jogo, ele não pode, de jeito nenhum, se enrolar de novo. A parcela precisa caber no orçamento dele. Quanto aos empreendedores, é preciso calcular muito bem para saber se o projeto em que se quer investir terá retorno suficiente para compensar os juros do crédito – explica.
O tomador também deve evitar dar o imóvel como garantia para tomar valores baixos, observa Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor executivo de estudos financeiros da Anefac:
– Não vale à pena usar o home equity para pagar uma dívida de R$ 20 mil, por exemplo. Isso porque o processo para obtenção dessa linha de crédito é burocrático e tem um custo, como as taxas dos cartórios. Acaba retirando a vantagem dos juros mais baixos.
Fabricio de Souza Pinto, de 40 anos, tomou há pouco mais de um mês um empréstimo de R$ 130 mil no Santander dando como garantia sua casa no Itanhangá, Zona Oeste do Rio, avaliada em R$ 360 mil. O objetivo era justamente se livrar de R$ 110 mil em dívidas contraídas em salgados cartões de crédito e no cheque especial. Para o empresário, o empréstimo significou um respiro em uma ciranda financeira que o atingiu durante a crise.
– Minha renda caiu 40% de antes da crise para cá, já que os negócios ficaram escassos. Foi aí que comecei a usar aqueles empréstimos ofertados no caixa automático do banco. Era tudo muito fácil porque tinha um bom relacionamento com a instituição. Mas os juros ultrapassaram em muito a expectativa que eu tinha – conta Fabricio. – Agora, finalmente consegui voltar a dormir tranquilo. Como tenho uma filha que depende de mim, preciso imaginar sempre que o pior cenário é possível. Então, não podia continuar naquela situação.
Fabricio diz ter consciência de que o empréstimo vai obrigá-lo a ser mais regrado. Tanto que seu objetivo é quitá-lo muito antes dos 15 anos de prazo. Mas, segundo ele, isso será mais fácil que tomar a decisão de alienar a própria casa.
– Culturalmente, foi uma barreira a ser quebrada. Quando pensei nisso a primeira vez, minha resposta foi “não”. A gente tem pelo imóvel um apreço que não tem pelo carro. Mas constatei que a situação não me permitia esse tipo de vaidade – diz. – Eu tinha financiamentos com juros altíssimos e passei para um empréstimo na casa de 1,5%.