Fonte: Ademi

A crise econômica impulsionou uma velha prática de mercado, mas pouco usada no setor imobiliário: a permuta. “As pessoas continuam com vontade de mudar de imóvel, mas, em tempos difíceis, preferem preservar o dinheiro guardado no banco ou simplesmente não tem caixa para investir em uma casa nova”, afirma o diretor comercial da imobiliária Coelho da Fonseca, André Souyoltgis. É nesse cenário que esse tipo de transação ganha espaço.
De acordo com ele, de 2015 até agora, o número de permuta de imóveis cresceu em razão da crise. “2016 foi o ano com o maior número de trocas em dez anos. Fizemos 2,5 vezes mais permutas em 2016 do que em 2015”, diz Souyoltgis, sem, no entanto, revelar os números dessas negociações. O negócio ficou tão em alta que a imobiliária Lello precisou criar um campo de busca novo em seu site.
“Em agosto, com o número crescente de pedidos, decidimos inserir a opção ‘permuta’ no portal. Assim, quem procura uma casa nova para comprar já consegue saber quais vendedores aceitam outro imóvel em troca”, explica o diretor de vendas da Lello, Igor Freire. “Os proprietários estão mais flexíveis, porque sabem que se não aceitarem um imóvel menor como parte do pagamento, podem ficar muito tempo esperando pelo comprador perfeito”, afirma.
Fernando Araujo Carneiro, de 33 anos, foi um dos que se beneficiaram com a maleabilidade dos vendedores. O eletricista queria sair do apartamento de dois quartos, sala e cozinha para morar em uma casa maior. Chegou a colocar seu imóvel à venda, mas ninguém queria pagar o valor que ele considerava ideal.
Junto com a imobiliária, resolveu apostar na permuta. Encontrou um proprietário que não estava conseguindo vender a casa de R$ 500 mil. “Ele decidiu aceitar meu apartamento e meu carro em troca, porque pelo menos teria uma parte do dinheiro em mãos. Era melhor do que esperar mais tempo pela venda tradicional”, diz Carneiro. O eletricista ainda obteve um financiamento imobiliário de R$ 200 mil para pagar o restante do valor.
“Para a minha família foi excelente. Queríamos mudar para uma casa melhor, com mais quartos e outras facilidades, mas não tínhamos dinheiro nem crédito para isso. A permuta possibilitou a realização do sonho”, conta. Dificuldades. Nem sempre, porém, é fácil combinar a compra e venda dessa forma. Apesar de a crise ter facilitado a permuta, compradores, vendedores e corretores podem enfrentar alguns percalços no processo. “É difícil encontrar dois clientes que tenham desejos conciliáveis. O proprietário do imóvel de valor mais baixo precisa achar um outro dono que aceite aquela casa ou apartamento como está”, diz Freire.
A dica para a permuta dar certo é aceitar Velocidade para os dois Quando um vendedor aceita permuta na negociação, ele pode se livrar mais rápido do imóvel. O mesmo vale para o comprador, que não precisa vender o bem antes de fazer nova aquisição. Dinheiro no banco Em vez de esperar muito tempo para vender um apartamento e continuar pagando condomínio e IPTU, por exemplo, o proprietário pode aceitar um imóvel de menor valor. Dessa forma, garante pelo menos uma parte em dinheiro e diminui os gastos com manutenção. Imposto de renda Com a permuta, o vendedor só tem ganho de capital em cima da diferença entre um imóvel e outro. Caso seja uma troca “taco a taco”, não há cobrança de imposto de renda em cima da venda.
Duas desvantagens
Vendedor e comprador têm de concordar com a troca; e encontrar a combinação perfeita pode levar tempo. Além disso, é preciso que as duas pontas paguem a comissão da imobiliária. Interessantes para as imobiliárias, porque garantem o pagamento de duas comissões, em cima do valor dos dois imóveis. “Por isso, é interessante que corretores se empenhem para realizar esse tipo de negócio”, diz Kechichian.
No entanto, é exatamente a comissão duplicada que pode atrapalhar algumas negociações. Como a pessoa que oferece um imóvel de menor valor como pagamento é, normalmente, a compradora, ela acredita que só a outra ponta é quem deve pagar comissão. “Ela não entende que, na verdade, também está vendendo o imóvel dela, e por isso, deve pagar pela intermediação imobiliária”, diz Freire. Para convencer os clientes, vale explicar que a permuta também tem vantagens tributárias.
“Se a troca é feita entre imóveis de valores iguais, não há cobrança em cima do ganho de capital no imposto de renda; ou então só serão pagos o ganho de capital em cima da diferença entre os dois imóveis”, diz o advogado especialista em direito imobiliário, José Guilherme Siqueira Dias. Veja outras vantagens no quadro acima.
Transação precisa seguir algumas regras para funcionar
Segundo o especialista em direito imobiliário e sócio da DGCGT Advogados José Guilherme Siqueira Dias, o contrato de permuta é mais sofisticado e complexo do que o de compra e venda tradicional. Isso ocorre porque, na verdade, uma permuta corresponde a uma dupla compra e venda. “Podemos dizer que os proprietários são compradores e vendedores ao mesmo tempo, pois estão repassando um imóvel e adquirindo outro”, explica.
A preocupação, que em uma compra e venda simples geralmente é maior apenas de um lado, acaba sendo recíproca na permuta. Como a operação é em dobro, as duas pontas precisam fazer os exames de documentação imobiliária. “Ambos estão comprando um imóvel, e por isso têm de se acautelarem”, diz o advogado. As trocas “taco a taco”, entre bens de mesmo valor (juridicamente chamada de permuta sem torna) não envolvem nenhuma parte do pagamento em dinheiro. Nesse caso, não há incidência de imposto de renda nem ganho de capital. Ainda assim, caso a negociação seja feita por intermédio de uma imobiliária, é necessário pagar duas comissões.
“Os dois clientes têm de desembolsar 6% do valor de cada imóvel para pagar a intermediação imobiliária”, diz Siqueira. “Por exemplo, quem está repassando um imóvel de R$ 1 milhão paga a comissão em cima desse preço. Aquele que está vendendo o de R$ 2 milhões, paga a taxa em cima dele. Outra duplicidade é no Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis. As duas pontas devem pagar o Duplicidade ITBI correspondente. Quando a troca é feita entre imóveis de valores diferentes e o restante do pagamento ocorre em dinheiro (permuta com torna), o vendedor – aquele que repassou o imóvel mais caro – deve declarar o ganho de capital no imposto de renda. E não são somente s os proprietários que devem se atentar.
“Na crise, a permuta fica mais forte. Por esse mesmo motivo, o corretor tem de ter cuidado redobrado na hora de analisar as documentações dos clientes”, diz o CEO da Imobiliária Mirante, Luiz Carlos Kechichian.
Segundo ele, quando a Negociação é compra e venda dupla. Por isso, imobiliária tem direito a receber comissão das duas partes Transação precisa seguir algumas regras para funcionar. “Se a imobiliária não prestar atenção, ela coloca a transação – que é dupla – em risco.”
Preços e valores. Outra curiosidade da permuta é o alto grau de subjetividade na hora de avaliar o preço dos imóveis.
“Na troca de um bem por outro, tecnicamente, não existe preço, porque não haverá pagamento em dinheiro – ou essa parcela será pequena. Esse valor em si perde um pouco a relevância”, diz o advogado. Ele exemplifica: “Eu atribuo o valor de R$ 1,5 milhão para o meu apartamento, mas não consigo vendê-lo por esse preço. Além disso, eu também quero comprar outro imóvel que custa R$ 2 milhões, mas não tenho dinheiro em caixa. Pode ser que, por algum motivo, o vendedor do apartamento mais caro goste do meu e o aceite na permuta, sem que eu precise complementar com dinheiro. Então, os imóveis que não tinham os mesmos preços acabam valendo a mesma coisa.”
Incorporadora oferece unidade por terreno
Apesar do crescente número de permutas de imóveis entre pessoas físicas, a troca mais comum é aquela oferecida por incorporadoras. “Quando uma empresa quer terreno para construir um prédio, ela oferece ao proprietário unidades prontas do empreendimento, em vez de pagar em dinheiro”, diz o especialista em direito imobiliário e sócio da DGCGT Advogados José Guilherme Siqueira Dias. Segundo o advogado, é mais fácil para a incorporadora, que não precisa de caixa antes mesmo de começar a construir os apartamentos.
“Os donos de terreno também têm vantagem, porque a unidade pronta de um empreendimento vale mais do que o terreno dele”, diz o diretor da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias, Luiz Fernando Moura. “É uma negociação importante para a atividade das incorporadoras, principalmente com crise econômica.” Mas esse tipo de permuta também tem desvantagem, como a demora para receber o pagamento do terreno ou o risco de atraso das obras e da entrega das unidades prontas. “Tem que avaliar bem as obrigações, prazos e penalidades especificadas nos contratos”, diz Moura.