Decisão do TJGO abre margem para rescisão de financiamento habitacional com garantia de alienação fiduciária
Um consumidor de Goiás conseguiu na justiça a suspensão das parcelas de contrato de compra e venda com alienação fiduciária sob o fundamento de direito do consumidor à rescisão do contrato. Em sua decisão, o desembargador Marcus da Costa Ferreira determinou a suspensão do pagamento das parcelas e a proibição de negativação do nome do consumidor até que haja resolução final do processo.
Para aquisição de imóveis – seja por financiamento junto ao construtor, seja por meio de financiamento habitacional – é comum que o construtor e o agente financeiro exijam a constituição de alienação fiduciária no imóvel. “Nos termos da Lei 9.514/97, alienação fiduciária ‘é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel’”, explica o presidente da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH), Vinícius Costa.
Mas para que essa garantia real tenha efetiva validade, a mesma lei determina que “constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título”, como completa o presidente da associação.
Ainda que a alienação fiduciária esteja regulada pela Lei 9.514/97 e os contratos de compra e venda mútuo pelo Código Civil, não se afasta destas operações a incidência do Código de Defesa do Consumidor, quando comprovado que o vendedor ou o mutuante atuam como fornecedor, como afirma Vinícius Costa. “Nesse caso, conforme ressaltou o desembargador, ‘a rescisão do contrato é um direito que assiste ao contratante, amparado pelas normas protetivas dos direitos dos consumidores, o que autoriza a suspensão da cobrança das parcelas restantes e a vedação da inclusão do nome do agravante como mal pagador, em decorrência do inadimplemento dessas prestações.”
Segundo o advogado, para situações em que se discute a compra e a venda com alienação fiduciária, fica até mais fácil de ser resolver, pois a demanda se restringe somente ao vendedor e o comprador. “Por outro lado, nos contratos de financiamento habitacional, a demanda obrigatoriamente deverá envolver, comprador, vendedor e agente financeiro”, acrescenta Vinícius Costa.
Contudo, o entendimento aplicado pelo Tribunal de Justiça de Goiás abre uma margem para a intocável discussão de rescisão dos contratos de financiamento habitacional com garantia de alienação fiduciária. “Cabe destacar, nesse ponto, que a própria Lei 9.514/97, que regulamenta o Sistema de Financiamento Imobiliário reconhece uma forma indireta de resilição contratual unilateral ao prever a possibilidade do fiduciante, com a anuência do fiduciário, dar seu direito eventual ao imóvel em pagamento da dívida, dispensados o s procedimentos previstos no artigo 27.”
Conforme Vinícius Costa, o ponto de discussão desse artigo estaria, então, em como se resolveria a restituição dos valores a que tem direito o consumidor, pois, nos termos do artigo 39, do Código de Defesa do Consumidor, é vedado ao fornecedor de produtos e serviços exigir vantagem manifestamente excessiva do consumidor. “Assim como determina o artigo 51 do CDC como nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código, autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor, e estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor.”
De acordo com o presidente da ABMH, a decisão do TJGO reacende a discussão, em especial, a necessidade de um diálogo mais forte entre as leis 9.514/97 e 8.078/90 (esta última que instituiu o Código de Defesa do Consumidor) para que se busque a resolução de contratos de financiamento habitacional que estão sob risco de inadimplência e que impliquem em supressão de direitos do consumidor de reaver eventual valor pago na relação contratual.
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