Medida atinge inadimplentes da faixa 1 do programa. No entanto, especialista da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação diz que é possível acionar a Justiça para evitar a perda do bem
No último fim de semana, o Minha Casa Minha Vida ganhou novamente destaque na imprensa com a notícia de que os inadimplentes da faixa 1 do programa terão os imóveis retomados. A medida foi tomada porque 25% dos contratos fechados com famílias que possuem renda mensal de até R$ 1,6 mil registram um atraso de mais de 90 dias no pagamento das prestações. Para quem está nesta situação, especialista da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH) diz que é possível acionar a Justiça para tentar garantir a posse do imóvel.
O agravamento da crise no Brasil e o receio da fiscalização dos órgãos de controle – já que até 95% desses imóveis são bancados com dinheiro público – fizeram com que o governo federal tomasse uma medida mais drástica para lidar com os atrasos nos pagamentos. Há especialistas que consideram, ainda, que as condições do MCMV 1, cujo público recebe subsídio de até 95% e as prestações não podem ultrapassar 5% da renda, com valor mínimo de R$ 25, facilitariam a inadimplência.
Independente dos motivos, o fato é que a medida é legal, já que os contratos de financiamento habitacional, incluindo os do programa MCMV, são feitos com base na Lei 9.514/97, segundo o presidente da ABMH, Lúcio Delfino. “Esta lei, que trata da alienação fiduciária de bens imóveis, facilita a execução da dívida e retomada do imóvel pela instituição financeira, em caso de inadimplência”, explica.
Segundo a Lei, passados 30 dias do início da inadimplência, o banco pode iniciar a execução extrajudicial do contrato. Nesta hipótese, é obrigatória a notificação pessoal do devedor (via cartório) para pagar o débito no prazo de 15 dias. “Passado esse prazo, o registro de propriedade do imóvel é transferido para o nome do credor, que, em seguida – já como novo proprietário – tem que levar o imóvel a dois leilões públicos. E se não existirem arrematantes, o imóvel fica definitivamente com o banco, em pagamento da dívida (prestações vencidas e saldo devedor)”, conta Delfino.
No entanto, o presidente da ABMH esclarece que, como se trata de uma execução extrajudicial, ou seja, sem passar pelo crivo do Poder Judiciário, é possível requerer a anulação do procedimento na Justiça. “Ou até mesmo uma indenização pela diferença entre o valor real do imóvel e o valor da dívida. Mas não é uma tarefa fácil e cada caso deve ser analisado isoladamente. A dica é não deixar que chegue nesse ponto”, ressalta.
Referente ao programa MCMV, em caso de desemprego ou perda de renda, desde que comprovados, o mutuário pode, ainda, recorrer ao Fundo Garantidor, que cobre o pagamento das prestações por até 36 meses dependendo da faixa de renda. No entanto, existem desvantagens, como acrescenta Lúcio Delfino. “O Fundo não paga a prestação: ela é incorporada ao saldo devedor e cobrada ao final do financiamento. Ou seja: se o prazo inicial era de 120 meses e o beneficiado utilizou o fundo por 12 meses, o novo prazo será de 132, e assim por diante. É bom lembrar que sobre essas prestações incidirão os mesmos juros e correção monetária do restante do financiamento.”
Mesmo assim, se houver dificuldade no pagamento de alguma parcela, o ideal é procurar o banco ou entidade de defesa da classe e negociar. “O importante é não ficar de braços cruzados”, destaca o presidente da ABMH.
Parcelas pagas não são devolvidas – Além de perder o imóvel, o consumidor pode arcar com outro prejuízo: a perda dos valores pagos e das melhorias realizadas no imóvel. De acordo com o presidente da ABMH, a lógica adota pelos agentes financeiros é a seguinte: o banco não vende imóveis, no financiamento habitacional, o mutuário toma um empréstimo financeiro para aquisição de um imóvel, o qual é dado em garantia da dívida. “Assim, no caso de inadimplemento das prestações, o banco credor executa o débito, levando o imóvel dado em garantia a leilão. No leilão, se não houver nenhum interessado (arrematante) ou se o maior lance for menor que a dívida, não haverá nenhum valor a ser repassado ao mutuário.”
Segundo a Lei 9.514, após 30 dias do vencimento de uma ou mais parcelas, o banco pode iniciar o procedimento de execução. Entretanto, a maioria dos contratos prevê que a execução só pode começar em caso de atraso de três ou mais prestações. Nesse caso, vale a regra mais benéfica ao mutuário. “O banco não tem praticamente nenhum risco de ficar no prejuízo. Quando o imóvel vai a leilão, o valor da arrematação é utilizado para quitação integral da dívida (prestações vencidas e vincendas) e se não houver arrematante, ele fica com o bem e pode, em seguida, vendê-lo como outro imóvel qualquer”, explica Lúcio Delfino.