Muito se discute hoje sobre o problema enfrentado pelas construtoras devido à grande quantidade de rescisões dos contratos de compra e venda de imóveis na planta. A questão central está sempre direcionada para ausência de regulamentação legal e também os prejuízos suportados pelas empresas. A alternativa para tentar afastar esse cenário é a edição de uma Medida Provisória sobre o tema.
Antes de adentrar na questão, o presidente da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH), Vinícius Costa diz que cabe entender, não do ponto de vista econômico, mas do ponto de vista jurídico a razão de tantas demandas. “Primeiramente, não devemos encarar toda compra de imóvel como um investimento. Na verdade, a grande maioria da população compra para morar e precisa inclusive de financiamento habitacional para o negócio. Porém, quando essa compra não dá certo é que começa o problema, isso porque os contratos de compra e venda são da modalidade de adesão e possuem cláusulas abusivas”, explica.
Não é incomum encontrar contratos de compra e venda que preveem retenção de todo valor pago até então (prática inclusive vedada pelo Código de Defesa do Consumidor), retenção superior a 50% do valor da compra, devolução do que é devido ao consumidor de forma parcelada e após a venda da unidade (questão já vedada pelo Superior Tribunal de Justiça). “Além da cobrança de despesa de corretagem, quando a mesma já foi repassada ao consumidor, ou seja, práticas que além de abusivas, já foram demasiadamente discutidas no poder judiciário. Só se tem tanta demanda assim porque os contratos impostos pelas construtoras exigem uma intervenção judicial, já que não dão margem para os consumidores”, completa o presidente da ABMH.
Por outro lado, Vinícius Costa diz que, analisando a questão da necessidade de concessão de financiamento para aquisição da casa própria, é preciso entender que o consumidor, mesmo sendo responsável pelo pagamento da parcela, não tem como garantir que o financiamento será concedido, pois depende de prévia avaliação do risco pelo banco, que, inclusive não está nem obrigado a conceder o empréstimo. “Aqui é que temos a situação mais preocupante: regra geral, essa análise de crédito ou não é feita de forma prévia pelo construtor, ou é feita por alguém contratado ou indicado pelo próprio construtor que, muitas vezes, utiliza de situações irreais (alteração da renda do comprador, por exemplo) para forçar a venda. Se o financiamento é negado pelo banco, qual a situação então que se aplica ao consumidor, considerando que não é nem investidor e nem está desempregado?”
A problemática vai muito além do que simplesmente dizer que 70% dos processos judiciais são movidos por investidores que desistem do negócio. O advogado diz isso pois, nas hipóteses em que a obra atrasa, o contrato sequer prevê uma penalidade contra o construtor, fazendo com que se gere uma demanda de rescisão do contrato, independentemente de ser ou não o comprador investidor. “Não são só números que expressarão a verdadeira realidade, e talvez nem mesmo uma lei rígida que vai conseguir abarcar todas as hipóteses possíveis de rescisão. O ideal é que o caso seja analisado detalhadamente e aplicado o melhor direito possível. Mas enquanto não houver por parte do fornecedor, no caso, o construtor, o pensamento de que o consumidor também tem seus direitos, nada se resolverá de forma amigável.”
A ABMH não vê com bons olhos a edição de uma medida provisória sobre o assunto, seja porque prevê muito mais direitos em favor dos construtores, seja porque não é possível por lei abarcar todas as situações de uma realidade mercadológica. “Melhor deixar a interpretação a cargo dos aplicadores da lei, no caso os magistrados, que com os elementos e provas apresentados pelas partes poderão chegar à conclusão do tipo de negócio que foi feito e de quem é a culpa”, conclui Vinícius Costa.
Por fim, o advogado questiona: “Se o investidor pedir a rescisão por atraso na entrega da obra também terá direito a multa de 50% cobrada, assim como pretendem cobrar na desistência?”